quarta-feira, 30 de maio de 2012

ESPAÇO COLETIVO - Maria Emília Bottini


MENINA QUE ROUBAVA LIVROS
Maria Emília Bottini

Sempre gostei de estudar, de ler, de escrever,quando passava as férias nos meus tios em Aratiba (RS), levava comigo meu estojo com lápis e meus cadernos, assim fazia desenhos, escrevia, fazia tema e me investia de professora de mim [sic.].

Recordar é viver, quando pequena fomos à casa do nono Joachin e da nona Graciosa e nas incursões da vida encontrei alguns livrinhos do Topo Gigio, para quem não o conhece ele era um ratinho com orelhas bem grandes e lindinhas, criado na Itália em 1958, lá se vai o tempo. Voltando a crônica, esses livros estavam numa mala velha em uma prateleira, fui até lá afundando meus pés em um caixote de milho, abri, li e me apaixonei então os roubei, sim os roubei, levei para casa e os escondi debaixo do colchão, por alguns dias lá permaneceram em meu esconderijo secreto, como um tesouro escondido até minha mãe fazer limpeza e descobri-los e sob protesto me fez devolver ao meu tio, dono dos livros.

Uma das coisas que me preocupa na vida é onde crianças pobres encontrarão suas malas-tesouros? Suas casas são de assombrar, escolas vão na mesma linha e se pensar em como guardamos os livros, bibliotecas geralmente são “sobras” de espaços, como me relataram duas professoras contadoras de histórias acabaram ocupando uma banheiro abandonado para colocar os livros, talvez fosse essa mais uma história que estavam contando, mas lamentavelmente não era.

Como vamos ajudar as crianças a desenvolver o gosto pela leitura, o prazer de conhecer histórias, de viajar e se apropriar do conhecimento em banheiros abandonados?

Sabemos que as famílias pobres mal tem comida, quanto mais livros, isso é objeto de quinta categoria, a urgência está na fome do corpo.

Mas será que somente a fome física deve ser saciada? E as outras fomes? Quem vai saciar? Quem passa fome fica com as sobras, com o resto.

A mim parece que esta fome de conhecimento deveria ser incentivada da infância a velhice, e por falar nisto conheci uma lady, sim uma madame culta que no auge de seus 77 anos, mantêm há 30, um clube de leitura, onde são lidos doze livros ao ano. Veja que ideia encantadora, ler com e para amigos, deve ser mais encantador ainda.

Mas é uma pena que isto seja apenas para alguns poucos. Porque não incentivamos doações, troca de livros, empréstimos, compra com menor valor. Precisamos estimular para que todos consigam ler e interpretar o mundo ao seu modo. Esse talvez seja um dos motivos que Big Brothers façam tanto sucesso, porque a cultura, o conhecimento se constrói também com leitores, melhor com os leitores críticos e reflexivos de seus mundos mundanos.

Mas como fazer isso sem livros? E sem bibliotecas aconchegantes, onde os livros possam dormir e serem acordados por mãozinhas ávidas por saber o que escondem. Biblioteca sem livros são apenas prateleiras. Sou sonhadora, reconheço, mas se puder, leia e sonhe com dias melhores.
[1]Psicóloga, Terapeuta Comunitária, Professora Universitária, Mestre em Educação pela Universidade de Passo Fundo (UPF), Doutoranda do programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade de Brasília (UnB). Assina a coluna Cine Emoção do Conselho Regional de Psicologia 1º região – DF.

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